segunda-feira, 29 de abril de 2013

Hortas Urbanas – A revolução alimentar será compartilhada… em Londres

23 de abril de 2013 Priscila Salvino
Os jardins urbanos ou hortas comunitárias estão tomando conta da cidade de Londres. Nos jardins das residências, nas áreas verdes dos prédios, nos terraços dos apartamentos, nos tetos das casas. Um verdadeiro movimento cultural que alguns já chamam de revolução do sistema alimentar. Moda ou não, a cidade e seus habitantes de todas as partes do mundo estão aderindo a esse movimento que conta com o apoio da prefeitura e de diversas organizações sociais. No ano passado, o prefeito da cidade, Boris Johnson, lançou uma campanha para a criação de 2012 hortas urbanas – “the food gardens”.

São muitos os motivos pelos quais as pessoas acham a relação com as plantas importante; e aqueles que vivem em centros urbanos não são diferentes daqueles que vivem nas áreas menos povoadas ou rurais. Em geral, as pessoas prezam o tempo ao ar livre em espaços verdes.

O homem sempre apreciou o uso da terra. A agricultura é uma atividade que se desenvolve no campo. Mas, ao longo da história, podemos perceber que essa atividade também se desenvolveu nas cidades.

No Egito antigo, os restos dos alimentos serviam de adubo para as fazendas urbanas. Em Macho Picho, existiam sistemas para conservar a água das chuvas e reutilizá-la para o plantio de legumes na cidade. Na Alemanha, no início do século 19, cotas de terras urbanas foram destinadas ao cultivo de alimentos para combater a fome, a crise e a pobreza. Durante a Primeira e a Segunda Guerras, nas cidades da Inglaterra, foram criadas muitas hortas comunitárias com o objetivo de reduzir a pressão da produção de alimentos e abastecer a população local.
Mas afinal, o que é agricultura urbana? Resumidamente, agricultura urbana é a prática de cultivar, processar e distribuir alimento dentro das cidades ou ao redor delas, mas dentro do perímetro urbano. Na Inglaterra, os espaços de terras urbanas destinados ao cultivo de legumes, vegetais e hortaliças são chamados de “allotments”. Os “allotments” geralmente pertencem ao poder público ou a Igreja, que os alugam aos usuários por tempo indeterminado.

Mas também existem allotments privados ou de organizações comunitárias. A ideia de “allotments”, na verdade, é bem antiga. Dizem que os saxões limpavam áreas de floresta e a dividiam entre o grupo para o cultivo de alimentos. Contudo, durante o decorrer dos séculos, o poder da terra passou a ser dominado pela Igreja e pelos lordes, restringindo o acesso a terra. No passado, “os allotments” eram pequenos lotes de terra situados no campo. Durante a revolução industrial, os habitantes dos campos se deslocaram para as cidades, aumentando a pobreza dos centros urbanos. Com isso, os “allotments” se tornaram uma característica das cidades. Em 1908, a lei que regula o uso dos “allotments” foi estabelecida, obrigando as autoridades locais a destinarem espaços de terra para o cultivo de alimentos no caso de demanda.

A NECESSIDADE

A Primeira e a Segunda Guerra também contribuíram para o aumento dos “allotments”. O Governo criou campanhas para a população cultivar alimentos nos parques, em terras desocupados e nos jardins. Após as guerras, a demanda por terra para construir habitações aumentou e isso reduziu o número de “allotments”.

Nos últimos anos, o espaço para novos “allotments” ficou limitado. E a demanda por esses lotes de terra não para de crescer. Hoje, em Londres, existem cerca de 30.000 allotments. E, talvez por conta do acesso limitado aos “allotments”, a agricultura urbana está desenvolvendo-se em outros áreas tais como parques, escolas, áreas verdes de propriedade privadas, espaços comunitários, fazendas urbanas, janelas, jardins, tetos dos prédios e das casas e sacadas. A cidade produz mel, vinho, frutas, verduras, carne, ovos e leite.

E qual são os motivos para a intensificação da agricultura urbana em Londres nos últimos anos?
Certamente, a crise alimentar e o consequente aumento do preço dos produtos contribuiu muito a busca de alternativas para o sistema de produção e consumo insustentáveis.

Nos últimos 20 anos, o preço do alimento na Inglaterra aumentou 26% e desde a década de 80, o pais tornou-se dependente das importações, que correspondem a 42% do mercado. Isso também tornou os ingleses mais dependentes do uso de combustíveis fosseis, como o petróleo. Alem disso, a crescente preocupação com a qualidade dos produtos consumidos e com o meio ambiente também favorecem a criação de mais hortas urbanas na cidade.

INCENTIVO PÚBLICO

A ideia de produzir e consumir ‘local’ foi difundida nos últimos anos em Londres, principalmente através do incentivo da prefeitura, que se comprometeu em criar esquemas que suportam a produção local. O atual prefeito, inclusive, formou um gabinete especialmente dedicado a questão alimentar e criou um projeto chamado “Capital Growth” visando identificar áreas na cidade que podem ser usadas para o plantio de alimentos, como parques, escolas, espaços desocupados, etc.

Paralelamente ao poder publico, muitas organizações sociais engajadas na expansão da agricultura urbana também exercem um papel fundamental no desenvolvimento do processo. Organizações como a Cultivate London, Sustain, Growing Communities entre outras, criam campanhas eficientes, popularizam a ideia, ajudam financeiramente aqueles que querem começar suas hortas, oferecem treinamento e muitas outras atividades.
 
A Growing Communities, por exemplo, situada no bairro de Hackney, leste de Londres, administra três feiras onde vende os produtos dos seus associados, alem de possuir um esquema de entrega de legum es e frutas a domicílio. A organização também administra uma fazenda.
Seu objetivo é transformar o sistema alimentar, criando uma alternativa que envolve o suporte aos produtores urbanos locais, alem de trazer o alimento o mais perto possível do seu consumidor. A organização também promove eventos, conferencias, debates, oferece treinamento e gera empregos. A organização serve 700 residências e alimenta mais de 3000 pessoas.

Para muitos, as hortas urbanas são uma forma de ativismo, um ato politico para rejeitar o sistema alimentar insustentável que temos no momento. Para outros, é mero lazer, uma chance de aprender novas experiências, de estar em contato com a natureza e de praticar uma atividade física, fazer parte de um grupo. Qualquer que seja a razão, os benefícios pessoais, sociais e ambientais dessa atividade são de extrema relevância.

Muitas hortas comunitárias promovem a biodiversidade através do cultivo orgânico, reduzem o resíduo através da reciclagem e da compostagem e minimizam o transporte do alimento. O impacto na economia da cidade ainda e pequeno, porem já existem muitos restaurantes e pubs que compram seus produtos das hortas urbanas. Nos últimos anos, novas oportunidades de emprego foram criadas e muitas comunidades se estabeleceram através das hortas ou jardins.

Certamente a agricultura urbana esta transformando a cidade de Londres. O movimento cresce a cada dia, hortas aparecem por todos os cantos, mais habitantes se envolvem com essa atividade … Quem sabe, essas hortas de agora serão as sementes de uma futura revolução alimentar.

*Priscila Salvino mora em Londres e é advogada, gestora e cientista ambiental, com formação e experiência no Brasil e no Reino Unido. Sou especialista em gestão resíduos e reciclagem, e presto consultoria a empresas privadas, prefeituras e organizações que almejam melhorar sua gestão sustentável de recursos. Trabalho também com mudança de comportamentos. Porém, acredito que, antes de mudarmos um padrão de comportamento, tanto pessoal, quanto profissional, é necessário entendermos as razões para adotarmos essas mudanças. Minha filosofia é: pequenas mudanças causam grandes impactos, inclusive para o nosso bolso. Priscila mantém o blog Priscila Salvino – Consultora Ambiental

Referência (ABNT):

SALVINO P. Hortas Urbanas – A revolução alimentar será compartilhada… em Londres, 23 abr. 2013. Disponível em: <http://revistasustentabilidade.com.br/hortas-urbanas-a-revolucao-alimentar-sera-compartilhada-em-londres/>. Acesso em: 30 abr. 2013.
Revista Sustentabilidade

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