sábado, 5 de outubro de 2013

Bem-estar animal


Rosemary Bastos alimenta um filhote de ovelha

Modo como os animais de criação são tratados está diretamente relacionado aos índices de produtividade dos rebanhos

Cuidar bem dos animais não é só uma demonstração de afeto aos amigos de quatro patas. No que se refere aos animais de produção - como bovinos, bubalinos, suínos, ovinos, caprinos, peixes e aves — a forma de tratamento pode fazer toda a diferença na produtividade. O manejo inadequado pode interferir, por exemplo, na qualidade da carne e do leite.

Segundo a professora Rosemay Bastos, do Laboratório de Reprodução e Melhoramento Genético Animal (LRMGA) da UENF — que coordena um projeto de extensão desde 2007 sobre bem-estar animal, guarda responsável e zoonoses em escolas direcionado as crianças/adolescentes e professores — o bem-estar animal é uma ciência que busca garantir condições básicas para uma boa qualidade de vida de todos os animais, sendo estes de produção ou não. 

O conceito de bem-estar envolve três elementos que se inter-relacionam: a questão física, mental e comportamental do animal — aspectos estes que podem interferir na produtividade e qualidade final do produto.

— Se a pessoa for agressiva durante o manejo, por exemplo, gera estresse no animal. Isso é altamente prejudicial, pois o estresse prejudica fisiologicamente, além de afetar o próprio desenvolvimento e a produção de carne ou de leite. Já se sabe que o estresse faz com que ocorra a diminuição da acidez da carne que é necessária para conservá-la; além disso, gera uma carne escura, dura e seca — explica a professora.

O manejo inadequado pode ocorrer, segundo Rosemary, em qualquer etapa do processo da cadeira produtiva, como na alimentação, no transporte e na condução para o abate, gerando prejuízos econômicos aos produtores e danos aos animais e tratadores. Ela observa que a prática do bem-estar considera as cinco liberdades necessárias aos animais: ser livres de medo e estresse; de fome e sede; de desconforto; de dor, lesões e doenças e a liberdade de expressar seus comportamentos naturais.
Juliana Costa

Rosemary destaca que as boas práticas voltadas ao bem-estar animal não requerem necessariamente custos ao produtor. Segundo ela, materiais de baixíssimo custo podem ser utilizados. Por exemplo, durante o manejo para condução de bovinos, podem ser utilizadas bandeiras feitas com sacos plásticos ou tecidos de baixíssimo custo. O objetivo do uso de bandeiras é orientar os animais, bem como minimizar os riscos aos peões, já que a haste é longa. Outro exemplo são os chocalhos para a condução de suínos, que podem ser feitos de garrafa pet, com pedras dentro. O intuito é sempre o de evitar o manejo agressivo e facilitar o entendimento do animal.

— O custo só é um pouco alto quando é necessário trocar toda a estrutura de confinamento, por exemplo. Mas o lucro compensa depois, pois o produtor pode se inserir na cadeia dos produtos agroecológicos e orgânicos e assim atingir um público-alvo mais exigente, disposto a pagar um preço mais alto pelo produto de melhor qualidade — diz a zootecnista Juliana Costa, que junto com Rosemary coordenou/ministrou o curso “Bem-estar animal: cuidar para produzir”, realizado este ano pela terceira vez, durante a Semana do Produto Rural da UENF.

Também é essencial que o ambiente de confinamento seja limpo, do contrário os animais podem evitar deitar mesmo quando cansados. Isso pode gerar problemas como, por exemplo, claudicação em bovinos. No caso dos animais que vivem no pasto, também é necessário que haja árvores e a quantidade e dimensões corretas de bebedouro e comedouro, de acordo com o número de animais. 

— Como existe dominância dentro dos rebanhos, nem todos os animais conseguem comer ou beber água se houver um número excessivo de animais para cada comedouro ou bebedouro. Há casos de fêmeas que, inclusive, tem a reprodução prejudicada devido a problemas nutricionais.

Juliana lembra que, em meio aos protestos ocorridos no Brasil recentemente, uma das reivindicações é a criação de um departamento específico, no campo do meio ambiente, para lidar com a questão dos maus tratos aos animais. A ideia é criar um canal no qual as pessoas possam fazer denúncias de crueldades contra os animais e que estas possam originar investigações mais direcionadas. É importante lembrar que todos os animais são protegidos por lei.
Os animais precisam de sombra

Rosemary e Juliana pretendem realizar em breve um projeto de divulgação das boas práticas animais (manejo racional), com palestras itinerantes nas propriedades do Norte Fluminense.

Fazendas em São Paulo e Mato Grosso já adaptadas

Embora a questão do bem-estar animal ainda caminhe a passos lentos no Brasil — se comparado aos demais países — já existem fazendas adaptadas no interior de São Paulo e no Mato Grosso. Segundo Rosemary, há até uma propriedade, no Mato Grosso, com certificado internacional de boas prática voltadas ao bem-estar animal. 

— Isso é muito importante, pois o Brasil é um dos maiores exportadores de carne, e alguns países da Europa, por exemplo, já solicitam este certificado. No exterior, já é comum que as fazendas tenham o selo de boas práticas de bem-estar animal. É uma exigência de mercado, à qual o Brasil também tem que se adaptar — afirma. 

Segundo a professora, as cinco liberdades relacionadas ao bem-estar animal foram criadas em 1992 pelo Conselho de Bem-estar de Animais de Produção do Reino Unido. As normas foram elaboradas após a denúncia feita por uma jornalista acerca dos maus tratos que os animais vinham sofrendo na década de 60. Hoje as cinco liberdades são utilizadas universalmente. 

— Se preocupar com o bem-estar animal é sem dúvida vantajoso para os animais, pessoas e para toda a cadeia produtiva. Esta será uma exigência universal para o futuro bem próximo e os produtores brasileiros realmente terão de se adequar para permanecerem competitivos no mercado nacional e internacional – conclui.

Thais Peixoto
Fulvia D'Alessandri

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