terça-feira, 14 de janeiro de 2014

Liga possibilita aos alunos de Medicina da Unicamp acesso aos fundamentos da Homeopatia



Entrevista: Patricia Brandimarti
Qual o espaço destinado à Homeopatia e a outras práticas integrativas e complementares nas faculdades? 

Segundo profissionais e estudantes, este espaço é reduzido ou até inexistente. Desta forma, os estudantes estão sendo privados de conhecimentos na área dos cuidados da saúde que são vigentes e que serão necessários na vida profissional, na medida em que são recursos de cuidados fomentados pela Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares (PNPIC).

O que fazer para mudar isso? 

O caminho encontrado por alguns alunos de faculdades das áreas médicas estão se organizando em Ligas que representam coletivos de resistência contra este processo de discriminação. É o caso da Liga de Homeopatia da Medicina da Unicamp (LHMU). Para saber mais sobre a história e o trabalho desenvolvido pela LHMU, o Ecomedicina entrevistou uma de suas coordenadoras, Patricia Brandimarti. Confira!

Ecomedicina: Conte um pouco da história da Liga. Qual o nome quando e como surgiu? Qual foi a motivação e o objetivo da criação dela?

Patricia Brandimarti: A Liga de Homeopatia da Medicina da Unicamp nasceu da preocupação de alguns alunos com a falta de uma disciplina que abordasse os fundamentos da Homeopatia (considerada especialidade médica desde 1980 pelo Conselho Federal Medicina) dentro da graduação do curso de Medicina da Faculdade de Ciências Médicas (FCM) da Universidade Estadual de Campinas.

Era o ano 2000 e os alunos da recém-ingressada 38ª turma de Medicina assistiram à realização do congresso “A Homeopatia no século XXI”, promovido pelo Departamento de Homeopatia da Sociedade de Medicina e Cirurgia de Campinas (SMCC) e realizado nas dependências da Unicamp numa tentativa de estabelecer o diálogo "Homeopatia e Universidade". Mesmo após brilhantes palestras, a FCM manteve sua posição: apesar da reforma curricular em curso na instituição, a Homeopatia não seria ensinada aos alunos de medicina.

Assim, um grupo de alunos interessados em continuar o estudo da Homeopatia passou a reunir-se semanalmente e foi criado um grupo de estudos, considerando inadmissível a formação médico-acadêmica sem que exista ao menos a possibilidade de obter informações sobre a doutrina homeopática. Em 2001, este pequeno grupo foi elevado à categoria de Liga Estudantil, constituindo-se então a Liga de Homeopatia de Medicina da Unicamp (LHMU).

Trata-se de uma entidade filiada ao Centro Acadêmico, e, portanto reconhecida pela Diretoria da faculdade. É uma associação civil sem fins lucrativos e fruto de uma iniciativa 100% estudantil com o objetivo de possibilitar aos alunos o acesso aos fundamentos da Homeopatia clássica e contribuir para uma melhor e mais completa formação médica e ética dos alunos, a qual exige a aquisição de pressupostos teóricos e científicos das diferentes formas da prática médica, para que possam instruir seus pacientes a respeito das diversas possibilidades terapêuticas.

A Liga conta com a orientação do Prof. Dr. Milton Lopes de Souza, docente da Clínica Médica da FCM-UNICAMP e médico homeopata formado pela Escola Paulista de Medicina (UNIFESP), e do Dr. Ruy Madsen Barbosa Neto, fundador da Liga de Homeopatia da Medicina da Unicamp, médico homeopata com título de Especialista pela AMHB, com graduação em Medicina e residência médica em Pediatria pela UNICAMP.

Ecomedicina: Neste período que trabalho vem sendo feito e quais têm sido os resultados obtidos?

Patricia Brandimarti: Desde a sua fundação, a Liga possui um calendário anual que inclui atividades de ensino, pesquisa e extensão. Dentro das atividades de ensino estão as aulas semanais da Liga durante o intervalo do almoço dos alunos da graduação. Podem participar estudantes de Medicina do 1º ao 6º ano e também estudantes de outros cursos da área da Saúde e também de outras áreas. O tema das aulas tem se mantido com poucas variações ao longo dos anos, principalmente devido à inexistência de uma disciplina curricular na grade horária do curso de Medicina que aborde essa especialidade médica, sendo necessário primeiro introduzir os fundamentos da Homeopatia para que depois seja possível desenvolver aulas mais temáticas. A Liga oferece, também, o Curso Introdutório às Práticas Integrativas, juntamente com a Liga de Medicina Integrativa e a Liga de Acupuntura, para que os calouros e outros interessados possam ter uma prévia do que é a Homeopatia e outras racionalidades médicas.

Complementando as atividades de ensino, a Liga contou com atividades ambulatoriais, nas quais os ligantes podiam acompanhar atendimentos no Hospital das Clínicas da Unicamp conduzidos por médicos homeopatas. No entanto, devido à ausência de médicos homeopatas para continuar tocando o ambulatório e à inexistência de interesse da FCM em manter a atividade de forma institucional, o mesmo foi desativado por volta de 2006-2007.

Em relação à pesquisa, atualmente estamos desenvolvendo uma para avaliar o Conhecimento em Homeopatia e em 2014 iremos realizar uma experimentação patogenética de medicamentos homeopáticos com participantes da Liga de Homeopatia e quem mais quiser participar, desde alunos de outros cursos até funcionários da Unicamp. Outras pesquisas já foram conduzidas em anos anteriores e podem ser encontradas no site: https://sites.google.com/site/ligahomeopatiamedunicamp/atividades/pesquisa/trabalhosconcluidos.

Já as atividades de extensão incluem a participação e organização de eventos de Homeopatia ou que promovam seus interesses. Já foram realizadas oito edições do Simpósio Médico-Acadêmico de Homeopatia da Unicamp com a participação de médicos e médicas homeopatas de grande relevância no cenário nacional. A Liga também participou dos três encontros entre Ligas de Homeopatia do Estado de São Paulo. Para 2014 estamos nos planejando para realizar o IX Simpósio Médico-Acadêmico de Homeopatia da Unicamp juntamente com o IV Encontro de Ligas de Homeopatia do Estado de São Paulo. Além disso, a LHMU participa anualmente dos eventos: Unicamp de Portas abertas e Workshop da Medicina Unicamp como forma de divulgação da Homeopatia e das atividades da Liga. No Dia da Homeopatia (21 de novembro) também promovemos a divulgação de informações sobre a Homeopatia em redes sociais.

Acreditamos que os principais resultados podem ser mensurados pela permanência e sobrevivência da Liga durante esses 13 anos, disseminando o conhecimento da Homeopatia entre futuros médicos e também pela aprovação da disciplina eletiva MD878 – Introdução à Medicina Integrativa no final de 2012. Após um ano de discussões envolvendo o professor Nelson Filice do Departamento de Saúde Coletiva da FCM, as ligas de Acupuntura, Homeopatia e Medicina Integrativa e a coordenadoria do curso de Medicina, foi possível essa conquista.

Apesar do caráter eletivo, já consideramos a sua existência como um primeiro passo para que o aluno de Medicina, de outros cursos da área da Saúde e de outras áreas possam ter contato com os fundamentos da Homeopatia (três aulas são dedicadas a essa especialidade na disciplina) e possam, dessa forma, ser capazes de ter uma postura mais crítica e menos preconceituosa com relação a essa racionalidade médica. No entanto, como a disciplina não inclui só o estudo da Homeopatia, mas também das outras racionalidades médicas (Medicina Alopática, Medicina Tradicional Chinesa, Medicina Antroposófica e Medicina Ayurvédica), a Liga continua tendo um papel de grande importância no aprofundamento e detalhamento dos fundamentos da Homeopatia.

Ecomedicina: Quais foram e quais são os desafios?

Patricia Brandimarti: Inicialmente, os principais desafios foram com relação ao reconhecimento da Liga pela Diretoria da FCM. Frases do tipo “Homeopatia é pajelança”, “Homeopatia é uma farsa, não serve para nada”, “se a Homeopatia funcionasse, faria parte da Alopatia”, “vocês são aprendizes de charlatão” foram ouvidas pelos alunos que participavam do grupo de estudos e que buscavam mais espaço para a Homeopatia na FCM. Mas com o passar dos anos, a Liga de Homeopatia foi conquistando seu espaço e o respeito dos alunos e professores através da seriedade com que suas atividades eram conduzidas, com reconhecimento de sua importância até por membros da coordenação do curso de Medicina afirmando tratar-se de algo que não é ensinado durante a graduação e por isso sua relevância.

Atualmente, existe o desafio de continuar despertando o interesse dos alunos em participar das atividades da Liga, bem como em cursar a referida disciplina eletiva. Outro desafio é o de tentar a reativação do ambulatório de Homeopatia no HC da Unicamp para que os ligantes possam participar também de atividades práticas e para que seus resultados em termos de saúde e bem-estar dos pacientes atendidos sejam uma forma de mobilizar a coordenação do curso a inserir oficialmente a Homeopatia na grade curricular da Medicina.

Ecomedicina: Você acha que isso se torna mais grave à medida que as práticas integrativas são fomentadas pela Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares (PNPIC)? Atrapalha a implantação da PNPIC no SUS?

Patricia Brandimarti: Sim. Se os centros formadores de profissionais da saúde ignoram as Práticas Integrativas, da onde virão os profissionais para que a PNPIC vire uma realidade? E como eles manterão seu trabalho quando existe todo um contexto envolvendo defensores do cientificismo, indústria farmacêutica, políticos e muito interesse financeiro que são avessos a uma medicina simples, barata e eficiente como a Homeopatia?

Ecomedicina: Neste sentido, quais são os recursos de resistência mais empregados e que têm mais sucesso?

Patricia Brandimarti: Achamos importante que os alunos entendam que participar da Liga não significa abandonar todo o conhecimento sobre a Alopatia que será ensinado ao longo da faculdade (afinal, um homeopata é antes de tudo um médico, saberá quando é necessário uma atitude com base no saber alopático para assegurar a vida e o bem-estar do paciente). Tampouco significa tornar-se um homeopata. Procuramos fortalecer o espírito crítico dos ligantes, para que recebam as informações e reflitam sobre elas, inclusive assumindo uma postura mais proativa com relação às informações recebidas ao longo do curso também, de tal forma a não considerá-las um dogma que não pode ser revisto. Reforçamos também que a Liga é a única via de contato com a Homeopatia que os alunos terão na graduação, o que não ocorre com a maioria das outras Ligas acadêmicas que acabam abordando um assunto/tema que será visto ao longo do curso.

Ecomedicina: Quais as expectativas e perspectivas?

Patricia Brandimarti: As expectativas são a de fortalecer cada vez mais o papel da Liga na universidade e conquistar um espaço na grade curricular do curso para o ensino da Homeopatia. As perspectivas são boas, pois apesar da resistência da coordenação do curso em permitir a inserção de Homeopatia na grade como disciplina obrigatória, é perceptível o respeito que a Liga tem conquistado em função de seus 13 anos de atividade de forma ininterrupta e sempre com muita seriedade e cumprimento de seu cronograma e plano de atividades.

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