quinta-feira, 16 de janeiro de 2014

Produção biodinâmica ganha adeptos entre vinicultores franceses

Um número crescente de produtores de vinho na França está adotando a agricultura biodinâmica criada pelo austríaco Rudolf Steiner, afirmando que ela melhora os vinhos. Mas há quem diga que isso é só marketing.

A colheita da uva está prestes a começar no vinhedo de Bernard Duseigneur, em Saint-Laurent-les-Arbres, no coração da região de Côte-du-Rhône, na França. O ex-banqueiro londrino, que retomou um negócio familiar, prova algumas uvas para verificar se elas já estão maduras.

Além de provar as uvas, Duseigneur também consultou um calendário astrológico para verificar o melhor dia para a colheita. O agricultor faz parte de um crescente grupo de vinicultores que aplica técnicas “biodinâmicas” em vinhedos.

“É bom ser orgânico porque não é preciso respirar produtos químicos. Mas, na condição de amante de vinhos, tenho que reconhecer que a agricultura orgânica não garante a qualidade do vinho”, afirma Duseigneur.

Para ele, a qualidade do vinho depende de reunir produtores e vinhedos em torno dos princípios escritos pelo filósofo, educador e místico alemão Rudolf Steiner há cerca de um século.

A agricultura biodinâmica é orgânica, ou seja, sem o uso de pesticidas, fungicidas e fertilizantes químicos. Mas seu conceito vai além, abrangendo também o movimento da lua e das estrelas e aplicando tratamentos “preventivos” no solo – um pouco na tradição da medicina chinesa, conta o vinicultor.

O objetivo é enriquecer o solo. Para isso, os agricultores biodinâmicos estimulam o surgimento de um ecossistema adequado, usando insetos, microorganismos, ervas daninhas e minhocas. Isso permite que as videiras cresçam num solo rico e puro, afirmam.

Sabor local

Essa técnica de produção agrada em particular vinicultores franceses. Na Califórnia, na Austrália ou na África do Sul, vinicultores acreditam que um bom vinho é fruto principalmente de seu trabalho. Na França, produzir um bom vinho significa sobretudo obter um produto que incorpore as características de solo e clima de uma região, do terroir onde é feito.

“Na Borgonha, os monges perceberam há mil anos que, usando apenas um tipo de uva – pinot noir –, eles podiam produzir vinhos muito diferentes, mesmo que as propriedades distassem apenas alguns metros umas das outras”, afirma Duseigneur.

Segundo ele, essa variação ocorre devido às diferenças nos solos. “Nós tentamos encontrar vinhos que expressem o caráter único de um local”, completa.

O conceito de agricultura biodinâmica cai como uma luva numa nação assim, avalia o especialista Olivier Magny. “Está em curso uma revolução discreta. Cada vez mais pessoas percebem que a agricultura biodinâmica deixa o solo mais vivo, o vinho mais interessante e, frequentemente, os preços mais altos”, afirma.

Magny acrescenta que a maioria dos melhores vinhos é biodinâmica. “Provavelmente o vinho mais caro do mundo, Domaine de la Romanée Conti, é biodinâmico há alguns anos”, opina.

Mas, embora certificados biodinâmicos, como Demeter ou Biodivin, possam indicar sabor e qualidade, consumidores não devem achar que esses vinhos estão sempre livres de aditivos químicos. Na Europa, é permitido que vinicultores orgânicos e biodinâmicos adicionem sulfitos para conservar o produto. A prática é frequente, apesar de esses produtores utilizarem uma quantidade menor dessa substância do que os tradicionais.

Nem sempre melhor

Mas com ou sem substâncias químicas, a ideia de que selos orgânicos ou biodinâmicos sejam indicadores de qualidade não convence o enólogo Michel Bettane, coautor do Grande Guia dos Vinhos da França.

“Há muita propaganda, hipocrisia, marketing e mentiras para o consumidor. É possível produzir um vinho excelente, utilizando de maneira inteligente substâncias químicas. Alguns dos melhores vinhos do mundo continuam sendo produzidos dessa maneira, e eles não são piores por causa disso”, afirma Bettane. “O vinagre é parte da natureza, mas o vinho, não. O vinho é parte da civilização.”

O especialista é cético sobre alguns dos métodos pouco usuais da vinicultura biodinâmica. Steiner escreveu longas instruções sobre maneiras de preparar o solo, aparentemente sem nenhuma experiências científicas para comprovar suas técnicas.

Uma de suas sugestões, a Fórmula 505, consiste em cortar cascas de carvalho em pequenos pedaços, colocá-las dentro do crânio de um animal doméstico, envolvê-lo com um pedaço de turfa e enterrá-lo num local onde corra muita água da chuva.

Em Côte-du-Rhône, Duseigneur demonstra uma de suas técnicas. Ervas daninhas recolhidas no vinhedo são fervidas, como se fossem um chá, e depois misturadas numa grande máquina. Em seguida, essa mistura é pulverizada no solo das videiras.

“Nós usamos princípios básicos. Na verdade, é senso comum. Pode soar um pouco maluco às vezes. Mas tem uma razão para tudo. Por exemplo, o estrume bovino, a nossa famosa Fórmula 500, é realmente um super-adubo”, afirma Duseigneur. “E pouco importa se há coisas que ninguém entende – o que interessa é que funciona.”

Por John Laurenson (cn), de Paris e edição de Alexandre Schossler – DW

Data: 17.10.2013

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