terça-feira, 10 de junho de 2014

Em Belém, PA, 47 espécies de aves estão provavelmente extintas

De acordo com a pesquisa do INCT Biodiversidade e Uso da Terra na Amazônia e da Rede Amazônia Sustentável, as extinções ocorreram no período de 1800-2000. Os últimos registros na região metropolitana foram feitos há 33 anos

Agência Museu Goeldi – Publicada recentemente na revista internacional Conservation Biology, pesquisa aponta que 47 espécies de aves podem ter desaparecido na região metropolitana de Belém nos últimos duzentos anos. Os últimos registros destes animais foram antes de 1980. Este é um dos grupos que sofreram perdas dentro da Área de Endemismo Belém, a mais ameaçada da Amazônia com apenas 28% de floresta original. A pesquisa foi realizada pelo INCT Biodiversidade e Uso da Terra na Amazônia e a Rede Amazônia Sustentável (RAS). A pesquisa é liderada pelos ornitólogos Nárgila Moura, Alexander Lees e Alexandre Aleixo, todos vinculados ao Museu Emílio Goeldi (MPEG).


A partir de uma extensa análise de coleções científicas e de documentos históricos, como os relatos de naturalistas do século XIX, os pesquisadores puderam identificar 329 espécies de aves de terra firme que ocorriam na região metropolitana. Destas, 14% não foram mais vistas, o que pode significar uma perda de 0.28 espécies por ano. Para se ter uma ideia, em um intervalo de 117 anos a perda anual na Mata Atlântica, na área de Lagoa Santa (MG), foi de 0.11. De acordo com o estudo, o período de perdas mais intensas foi no século XX, com 80% de registros entre 1900 e 1980.

Causas – Os dados históricos foram comparados aos inventários de biodiversidade de Paragominas (PA), um dos locais de estudo do INCT Biodiversidade e Uso da Terra na Amazônia e da Rede Amazônia Sustentável. O município é o que possui a maior extensão de florestas na área de endemismo Belém. Os pesquisadores identificaram que as espécies que desapareceram da região metropolitana têm ocorrência restrita às áreas de floresta intactas em Paragominas. A hipótese da extinção local está relacionada à suscetibilidade destas aves à perda de habitat e à caça.

Treze espécies registradas antes de 1900 possuem massa superior a 1 kg. São aves de caça, aves de rapina e psitacídeos de alto valor comercial, como o jacamim-de-costas-escuras (Psophia obscura), gavião-real (Harpia harpyja) e ararajuba (Guarouba guarouba), respectivamente. A explicação que os pesquisadores dão é a de que as extinções destes animais maiores ocorreram devido à caça para alimentação, além da perseguição de aves que atacavam criações de animais e do comércio ilegal.

Outras causas prováveis estão relacionadas às perdas e distúrbios florestais, associadas à construção da estrada de ferro Belém-Bragança, de 1883 a 1908, e o consequente aumento da população e número de assentamentos na década de 1960.

Segundo Dr. Alexander Lees (Museu Goeldi), que já estuda aves na Amazônia há mais de 10 anos, “a extinção de aves pode significar a perda de serviços ecossistêmicos e de espécies que regulam a população de outros animais. Assim, o ambiente fica em desequilíbrio, o que pode gerar um efeito em cascata” As aves são um dos grupos de animais mais bem estudados no mundo e a perda destes animais serve também como um sinal para a provável perda de outros vertebrados, plantas e insetos nos remanescentes florestais da Amazônia.

Singularidade de Belém - A região metropolitana de Belém é um espaço singular para o estudo da avifauna por ser a área que concentra estudos ornitológicos mais antigos da Amazônia, além de ainda possuir 6.399 km² de áreas protegidas, com aproximadamente 43% de florestas.

A autora principal do estudo, Dra. Nárgila Moura (Museu Goeldi), explica a importância de pesquisas como esta para a proteção da biodiversidade local: “A região de Belém ainda possui floresta dentro e ao redor, unidades de conservação que estão sendo desmatadas e degradadas a cada ano. O nosso trabalho serve de alerta para que essas áreas sejam protegidas com mais rigor e que políticas de recuperação florestal sejam implementadas para garantir a proteção das espécies que ainda persistem na região”.

Ameaça – Este não é um processo localizado apenas na região metropolitana de Belém. A mesma situação é observada em outras regiões dos trópicos, onde, segundo os pesquisadores, a extinção de espécies é mais intensa. Na região tropical, a biodiversidade é mais rica, as mudanças no uso do solo são mais severas e as taxas de extinção são altas.

Estudos sobre causas e padrões destas perdas têm crescido, porém os pesquisadores apontam que ainda há uma lacuna em relação à compreensão de tendências de persistência e extinção de espécies em períodos de longo prazo em áreas alteradas pelo homem. Estimativas de perda de espécies ajudam a compreender o estado atual e as tendências da biodiversidade, cooperando para identificar prioridades de conservação e de restauração florestal, e assim evitar outras perdas biológicas.

A coordenadora do INCT Biodiversidade e Uso da Terra na Amazônia, Ima Vieira (Museu Goeldi), aponta a necessidade de aproximar informações como esta, geradas pela ciência, da sociedade em geral: “Os processos educativos atuais, por exemplo, são muito fragmentados, não permitindo que os estudantes construam uma noção equilibrada a respeito dos problemas socioambientais em seu contexto amazônico. Por isso, a implantação de políticas públicas que visam mudanças de comportamento em relação ao meio ambiente e à Amazônia, em particular, devem envolver planejamento e metas de longo prazo com vistas a construir novos padrões de relações entre ciência, tecnologia e sociedade”.

Os próximos passos do projeto se concentram na investigação de biodiversidade e de dinâmicas de uso da terra associadas aos impactos causados pela produção de biocombustíveis.

Avifauna ameaçada no Parque Zoobotânico - Das 47 espécies listadas no artigo, sete ainda podem ser vistas no Parque Zoobotânico do Museu Paraense Emílio Goeldi (MPEG): urubu-rei (Sarcoramphus papa), gavião-real (Harpia harpyja), arara-azul-grande (Anodorhynchus hyacinthinus), ararajuba (Guarouba guarouba), arara-piranga (Ara macao), mutum-cavalo (Pauxi tuberosa) e arara-vermelha-grande (Ara chloropterus).

Durante o mês de junho, a Escola da Biodiversidade Amazônia (Ebio) do INCT Biodiversidade e Uso da Terra na Amazônia, educadores, biólogos e veterinários do Museu Goeldi desenvolverão atividades de educação chamando atenção para o trabalho realizado pelo Parque Zoobotânico no abrigo de espécies de aves ameaçadas na região.


INCT Biodiversidade e Uso da Terra na Amazônia – Sediado no Museu Paraense Emílio Goeldi – MPEG, este INCT tem como foco pesquisas, ações de educação e comunicação da ciência no Arco do Desmatamento, uma área de 244.420 km², que se estende pelo sul da Amazônia, do Maranhão ao Acre, abrange 524 municípios, 36 unidades de Conservação Federais e Estaduais e 99 Terras Indígenas. O objetivo é que os estudos em biodiversidade, paisagem amazônica e educação para sustentabilidade subsidiem a formulação de políticas públicas ambientais na região.

Rede Amazônia Sustentável – É uma iniciativa inovadora estimulada pelas redes dos projetos “Agroambiente”, “Unindo pesquisa e educação ambiental para reduzir queimadas na Amazônia” e por subprojetos do INCT Biodiversidade e Uso da Terra na Amazônia: Análise custo-benefício entre Conservação e Desenvolvimento (coordenado por Toby Gardner – Stockholm Resilience Centre e Joice Ferreira – Embrapa Amazônia Oriental), Determinando os custos sociais e ambientais de queimadas na Amazônia (coordenado por Jos Barlow – Lancaster University/MPEG e Ima Vieira – MPEG) e Dinâmicas de usos da terra no leste do Pará (coordenado por Ima Vieira – MPEG). A Rede conta ainda com a participação do Programa Amazônia da organização não governamental The Nature Conservacy (TNC).

Texto: Luena Barros
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EcoDebate, 10/06/2014

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